sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

Cassandras do Ambiente

Diz a mitologia grega que Apolo, querendo seduzir Cassandra, lhe deu o dom da profecia, mas que não sendo correspondido, ele lhe amaldiçoou para que ninguém acreditasse nela. Não sem motivo, Cassandra é frequentemente mostrada arrancando os cabelos.
A vocação de Cassandra dos ambientalistas é até anterior ao apogeu grego, mas vou me limitar às previsões mais recentes.
No começo dos anos 60, Rachel Carson publicou Primavera Silenciosa, o livro mais amado, odiado e menos lido que conheço. Seu sucesso fez dele um imenso telhado de vidro. Se você se ativer aos detalhes, de fato achará um mar de enganos, mas no atacado o livro acerta muito. A fertilidade masculina só se reduz desde os anos 50, assim como adiantou-se a data da primeira menstruação e sofremos cada vez mais de cânceres precoces. Não só no Brasil, nem na América do Sul. Não só no ano passado, nem só na última década.
A primavera não está silenciosa, mas muito menos espécies estão fazendo barulho.
Igualmente, desde os anos 70 que há pessoas preocupadas com a brusca mudança do clima, e ainda hoje muitos não enxergam, ou não querem enxergar, como o legislador norte americano que levou um bolo de neve para a sessão (seria ignorância preferível à desonestidade?). Pelo tanto que já influencia a vida de todos no planeta, e pelo tanto que ainda vai influenciar, esta talvez seja premonição que mais cabelos custará a Cassandra
Também faz décadas que ouvimos os protestos pelo desmatamento da Amazônia, mas preferimos achar que a a conversa que tudo está interligado seria uma coisa meio hippie, meio bicho-grilo. Eis que os climatologistas comprovam que a água que mantém a parte mais economicamente ativa da América do Sul vem exatamente da Amazônia. Ou seja:   a água que a fábrica de móveis usa para transformar madeira da Amazônia em dormitório completo casal capelinha vem exatamente da Amazônia.
A Amazônia agrega valor à economia, disse Cassandra fazendo pouco do jargão administrativo...
Faz muitos anos que as Cassandras do ambiente estão avisando que há um mar de usinas de energia entre nós, prontas para produzir sem impacto ambiental algum, que se chama aumento de eficiência. Em nível de usinas, com a troca de equipamentos, em nível doméstico, urbano e até pessoal. Os combustíveis fósseis nos tiraram da crise de energia mas nos lambuzamos com ele...
Há décadas, as previsões nos mostravam em veículos voadores, iríamos de jato ao trabalho. Recentemente passamos a andar de bicicleta no futuro. Apesar de fugirmos dele sempre que podemos, precisamos de mais trabalho braçal. Não só a nossa espécie, mas todo o planeta precisa que façamos mais com nosso corpo e menos com energia de fora. Na idade média vivíamos um gargalo energético, do qual fomos retirados pelo carvão, e depois pelo petróleo, no qual nos lambuzamos. Para sair disto precisaremos não só de células solares, mas também de limitar nosso gasto de energia para manter o que é essencial. Troque sua academia por uma horta, por exemplo. Troque o carro por ir a pé, ou bicicleta. Troque o trabalho de 15 h por dia, por fazer consertos em casa. Sua vida familiar e seu planeta agradecem.
Mas os ambientalistas também erramos. Há uma década começamos a usar um modelo de usina hidrelétrica que não depende de grandes represas, As usinas de fio de água. Foram consideradas um avanço por reduzir o impacto ambiental. Não antecipamos que com as mudanças climáticas as secas seriam um estado normal e as represas poderiam ser um fator benéfico para ecossistemas e pessoas.

Da mesma forma, a energia nuclear era o vilão incontestável dos anos 80, mas descobrindo o efeito da queima de carbono, muitos chegaram a considerá-la uma alternativa, mesmo com todo o risco associado.

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